Conheci a Ana Lúcia no meu primeiro ano da universidade, vinha transferida de outro curso, acho que era enfermagem. Como não era caloira não covivíamos muito com ela mas em breve a sua presença impôs-se entre nós. A Ana Lúcia era especial, circulavam histórias sobre ela a todo o vapor. A maior parte delas prendiam-se pelas perguntas singulares que dirigia aos profs, já agora, tratava-os sempre por sr. doutor, o que eles odiavam, até porque a a maioria não eram senhores doutores coisíssima nenhuma. As perguntas eram de tal ordem que punha toda a gente a pensar se ela era realmente fraca de ideias ou se estava apenas no gozo. Tinha um cabelo oxigenado, era alta e usava óculos, vestia-se como a minha mãe se vestia quando tinha a minha idade, mas na altura percebia-se, era moda. Andava sempre com um guarda chuva XXL com o qual agrediu um colega nosso só porque ele disse qualquer coisa particularmente nojenta, não me lembro muito bem mas acho que tinha a ver com mucosas nasais. Foi minha parceira numa aula prática de química e como tinha tanto jeitinho como eu para manusear tubos de ensaio, a nossa experiência resultou num fracasso completo. Quando eu estava sorrateiramente a copiar os resultados dos colegas de lado ela vociferou: Ai não! Temos de repetir! A professora, que estava com tanta vontade de ficar mais meia hora no laboratório quanto eu, fingiu que não ouviu e eu lá consegui copiar os resultados. Quando consegui mudar de turma a química (eu fugia das aulas às oito da manhã como o diabo da cruz), a Ana Lúcia apanhou-me num corredor e de guarda chuva em riste acusou-se de só ter mudado de turma por causa dela. Lembro-me que houve um professor que um dia lhe disse taxativamente: O que voçê está aqui a fazer? Isto não é para si! Passados uns tempos a Ana Lúcia foi-se apagando da paisagem, não sei sequer se chegou a acabar o curso. Então porquê que estou a falar disto hoje? Porque a encontrei. Aliás neste ultimos sete (ou oito) anos encontro-a esporádicamente e é sempre a mesma coisa: em menos de um minuto e com três perguntas apenas consegue ficar sempre a saber da minha vida toda, ignora quaiquer questões que lhe faça e despede-se sempre com muita pressa de ir a qualquer lado. Mas desta vez, (ah!) ia ser diferente. Vinda do mercado e carregando dois ramos de flores e um de salsa (a verdadeira razão pela qual fui ao mercado), vi-a ao longe e pensei: hoje não me ganhas!
Lá veio ela toda sorridente na minha direcção espetou-me duas beijocas, ignorou a minha ingénua pergunta: Então que andas a fazer? e de uma rajada inquiriu: já cabaste o curso? estás a trabalhar? já fizeste o estágio? Respondi a tudo o mais rápido que pude para poder devolver as perguntas, mas não consegui, e lá foi ela com muita pressa, com o seu cabelo amarelo a esvoaçar ao vento.
A Ana Lúcia é especial.
( e não a ignoro porque continua a usar o mesmo tamanho de guarda-chuvas)
4 comentários:
Não sei porquê mas a vida permite-nos conhecer sp cada personagem.
A última figura q conheci, devo agradecer a minha mana Boni, pq além dela o ter conhecido tb nos apresentou, é verdade, à q partilhar (o bom e o mau).
Era o “Irunhas” (nome carinhosamente baptizado por nós) mas o verdadeiro nome era Silvestre, a sério!!
Mas uma coisa é certa, são estas personagens são impagáveis.
Também conheci umas personagens jeitosas no tempo da universidade, uma chamava-se Crescêncio e o sotaque serrano não enganava ninguém, labrego como poucos, só falava de adegas, vinho, futebol, noitadas jogando cartas e cenas tipo "logo à noite vou comer a XPTO" (claro que chegava à altura da verdade e nem olá lhe dizia, para gozo do resto da malta).
Uma vez pegou comigo ao descobrir que era eu filho único, dizendo: "Os filhos unicos são uns priveligiados e têm tudo".
O que ele foi dizer, nessa noite levou com um sermão em cima...
Anos mais tarde, já eu estava a acabar o curso, descobri que os pais do Crescencio eram professores. Pelos vistos maus professores, pois se deram uma educação à sec XIX ao filho, imaginem como serão relativamente aos alunos...
hehe, também me questiono sobre as mesmas coisas...também nunca consigp que ela me responda a nada e, sim, também me sinto intimidada pelo tamanho do seu guarda-chuva
Rita Sousa
kimikkal: crescêncio????? o rapaz foi condenado à nascença ó valha-me!
Ritinha: estou mais descansadita pensava que era a sua única vítima!
susie: depois da contribuição do kimikal o nome silvestre já não tem a mesma piadapois não?
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